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Assistência Social

O MANGUINHO 78 – 06 DE ABRIL DE 2023

Diálogos sobre a tuberculose

“Mapa de incidência de tuberculose por área programática (AP 3.1) de residência.” No município do Rio de Janeiro em 2021. As partes mais escuras indicam uma alta concentração de casos. O círculo azul destaca Manguinhos. Fonte: Boletim Epidemiológico – Tuberculose no município do Rio de Janeiro: perspectivas e desafios | 2022

O último número do O Manguinho foi sobre tuberculose e provocou muito interesse em nosso grupo de WhatsApp. Rolou um diálogo um diálogo bem rico com uma troca intensa de informações e materiais comunicativos sobre essa doença. O Manguinho desta semana foi construído baseado nesses diálogos e nessas informações. Nessa conversa foram dados vários exemplos que mostram o quanto a tuberculose está profundamente associada com as más condições da vida e do trabalho das pessoas.

Na cidade do Rio de Janeiro, a população privada de liberdade, a população de rua e os moradores de favelas são os mais atingidos. Segundo o Boletim Epidemiológico de março de 2022, Manguinhos apresenta uma alta concentração de incidência da tuberculose e de abandono do tratamento.

Para a médica Celina Boga, trabalhadora do Centro de Saúde Germano Sinval Faria (ENSP/Fiocruz), muitas pessoas procuram a unidade de saúde depois de muito tempo que estão doentes. Algumas até, meses depois. Em uma situação como essa a transmissão dentro de casa ou até mesmo no ambiente de trabalho já ocorreu. A doutora Celina, disse:

“Como é difícil explicar a transmissão! Pelo ar! Pela tosse! Ninguém “vê” isso ocorrer. Mas ocorre! O que sinto neste trabalho que faço é que não haverá melhora da incidência desta doença se as condições de vida, trabalho e moradia das pessoas que moram em territórios como Manguinhos, não forem alteradas. Não acredito!”

Ela compartilhou no grupo de WhatsApp um exemplo do quanto é complexa a situação em relação à tuberculose:

“Acompanho um paciente com que mora na casa da mãe. Essa casa tem alguns basculantes no andar de baixo. Em uma visita que fiz comentei sobre isso pois os basculantes estavam fechados. Sugeri abri-los! A resposta foi: não é possível manter aberto pois os ratos entram e invadem minha cozinha!!!!”

Campanhas do esclarecimento

A líder comunitária e moradora de Manguinhos, Elenice Pessoa, também acredita ser importante o investimento em trabalho educativo e campanhas de esclarecimento:

“Infelizmente com essa pandemia, foram dois anos, não é? Houve a suspensão das visitas periódicas. Eu acredito que se houvesse campanhas e mais presença da estratégia da Saúde em estarem fazendo esclarecimentos, encontros que sejam de esclarecimento para a população, em relação à doença, às precauções, em relação às pessoas darem continuidade ao tratamento até o final. Eu acredito que este quadro mudaria quase 100%, pelo menos 90%.”

Para a moradora Silvia Silva, a falta de conhecimento em relação às doenças infectocontagiosas é um problema a ser enfrentado:

“Então, o que eu acho, dentro da minha visão, a partir do trabalho de campo que eu fiz em Manguinhos há vários anos. O que acontece é que os moradores das comunidades eles não tem conhecimento ou o conhecimento deles é muito pouco em relação às doenças infectocontagiosas. E foi isso que eu observei. Também tem receio de falar que tem, que está com a doença. Esse é o maior problema. Então um contamina o outro que não sabe. Nós estando vivendo isso aí. Precisamos de políticas públicas de saúde, políticas públicas de meio ambiente, políticas públicas sociais e nada é feito. Não estou vendo nada sendo feito. Estou vendo Manguinhos completamente abandonado pelos políticos e pelas políticas públicas.”

Mais informações!

Estas mensagens, que circularam no grupo, mostram que a falta de entendimento das pessoas em relação à tuberculose é uma das dificuldades de superação dessa doença em Manguinhos. Para o enfrentamento deste problema é muito importante a popularização de informações, como o link do Observatório Tuberculose Brasil no Facebook, que o Carlos Basilia disponibilizou no grupo. Lá encontramos as seguintes informações: o Brasil encontra- se entre os 30 países que apresentam a mais alta carga de tuberculose no mundo. A incidência no Brasil é de 32 casos para cada 100 mil habitantes, no estado do Rio, são 60 casos, e na capital, são 104 casos.

Já que a tuberculose é um problema tão sério que tal estudarmos juntos sobre essa doença assistindo o vídeo que a Dra. Celina sugeriu no grupo? É só clicar aqui. Venha participar dessa conversa entrando em nosso grupo de WhatsApp.

O Manguinho

O MANGUINHO 76 – 23 DE MARÇO DE 2023

Ser mulher em Manguinhos

Virgínia de Fátima Lourenço, moradora de Manguinhos há 30 anos.

As mulheres de Manguinhos têm a saúde prejudicada por vários motivos. Só o fato de pertencerem à classe trabalhadora já é um agravante, mas as difíceis condições de vida nesse território pioram ainda mais a situação. Saúde e bem estar envolvem diversos aspectos da vida, como acesso a lazer e alimentação de qualidade; condições de trabalho, moradia e renda dignas; e até a relação com o meio ambiente. Mas não é apenas a falta da maioria dessas coisas que impedem que as mulheres de Manguinhos tenham acesso a saúde e bem estar. A discriminação agrava ainda mais um cenário que já é desanimador. Além do trabalho, que muitas vezes já tem uma carga pesada, elas ainda tem que assumir outras atividades, como as diversas tarefas domésticas e a responsabilidade de cuidar de crianças, idosos, pessoas com deficiência, e doentes.

A voz das mulheres

Conversamos com a Virgínia de Fátima Lourenço, moradora de Manguinhos, e ela nos contou um pouco sobre as suas dificuldades:

“Oi, eu sou Virgínia de Fátima Lourenço da Silva, moradora aqui de Manguinhos há 30 anos. Então, assim… eu sou negra, entendeu? Eu quero contar um pouco da dificuldade que eu tive com meus filhos na escola, no CIEP. [Dificuldades] de ir buscar, de levar… Ida e volta para o trabalho… Volta de novo correndo! Dificuldade de arrumar pessoas pra pegar eles na escola para mim. Muitas vezes eu tinha que vir correndo do trabalho, esperando condução para mim pegar ele na escola. Nunca teve um curso também para eles aprenderem um ofício, para serem melhores na vida, para terem um aprendizado, pra ser um aprendiz melhor. Então é isso que eu estou falando, entendeu? De tudo que eu já passei. De tudo! A minha luta até hoje continua, entendeu? A minha luta de dentro de casa, eu trabalho fora também, então é isso aí!”

 Elizabete Ferreira da Silva, também deu seu depoimento:

“Meu nome é Elizabete Ferreira da Silva, sou moradora de Manguinhos, tenho 49 anos e sou nascida e criada em Manguinhos. Trabalho por conta própria em casa, porque cuido da minha mãe que tem 86 anos. Ela tem Alzheimer, é cadeirante, usa fralda e depende de mim até para comer, 100% dependente. Por isso não posso trabalhar fora e apesar de minha mãe ter mais filhos só eu cuido dela. Então, para mim ser mulher, negra e moradora de Manguinhos é dificultoso, pois nessas últimas enchentes passei muito sufoco, vi a água entrando em casa e eu quase entrei em desespero! Consegui falar com uma prima que veio com a água acima da cintura e ela que me ajudou a levantar minha mãe. Pois tenho problemas na coluna, joelhos e tornozelos. É ela quem me ajuda todos os dias a dar um banho na minha mãe. Enfim, é muito importante ter ajuda das redes de apoio, pois não posso contar com meus irmãos para nada. Agradeço pela oportunidade de estar me expressando.”

Elizabete Ferreira da Silva e sua mãe Maria Ferreira da Silva.

Direitos negados?

Quais são os direitos que estão sendo negados para estas mulheres? Estes são casos isolados ou representam a realidade de muitas mulheres em Manguinhos? O que é necessário para promover igualdade de gênero, autonomia econômica e acesso a saúde integral para as mulheres do território? Como podemos garantir a permanência das mulheres em todos os espaços sem lhes negar nenhum direito? As mulheres formam a maior parte da população brasileira e é necessário que existam políticas públicas que garantam a diminuição desta sobrecarga que recai sobre elas. Um bom exemplo seria o compartilhamento do cuidado de crianças e idosos com os serviços públicos e políticas que sejam construídas de forma a garantir o atendimento de necessidades e demandas de mulheres como a Dona Virgínia e a Dona Elizabete. Elas falam de desafios que precisam ser tratados de maneira transversal, intersetorial e participativa.

Para isso temos que ter a consciência de que a garantia dos direitos das mulheres é indispensável para a construção de uma sociedade mais democrática, em que as necessidades das mulheres sejam reconhecidas e respeitadas.

Quais políticas públicas deveriam ser implementadas para que fossem atendidas as necessidades e demandas que foram citadas nos depoimentos de Dona Virgínia e de Dona Elizabete? entre em nosso grupo de WhatsApp e venha conversar sobre isso.

O MANGUINHO 74 – 02 DE MARÇO DE 2023

Um CRAS para Manguinhos

O Manguinho

O abaixo-assinado organizado pelo MCP pode ser assinado presencialmente no Postinho da Fiocruz (Centro de Saúde Escola) ou virtualmente clicando na foto acima. Crédito da foto: Maria Clotilde – ACS da Equipe Amizade.

As enchentes que atingiram dezenas de moradias e famílias de Manguinhos nas últimas semanas mobilizaram muitos moradores, movimentos e lideranças comunitárias para tratar sobre o assunto. O que é necessário fazer para que tragédias como essas não se repitam? Como os serviços públicos precisam atuar para atender essas famílias e pessoas que tiveram suas casas alagadas e seus pertences destruídos? Entre os diversos assuntos e problemas apontados em nosso grupo de WhatsApp, O Manguinho chama atenção para a importância do serviço público de assistência social.

O CRAS (Centro de Referência de Assistência Social) tem como papel auxiliar famílias e pessoas em situação de vulnerabilidade pessoal e social. Em Manguinhos, não há uma unidade deste serviço que seja responsável por atender os moradores deste território durante todos os dias da semana. O CRAS Caio Fernando de Abreu que fica na Avenida dos Democráticos não atende Manguinhos. Os moradores de Manguinhos que necessitam deste serviço público precisam se dirigir ao CRAS Ramos que fica próximo ao Morro do Alemão.

Um CRAS em Manguinhos

Por conta deste problema um abaixo-assinado foi feito pelo Movimento das Comunidades Populares de Manguinhos reivindicando a instalação de um CRAS em Manguinhos para atender os moradores em seu próprio território. E que este funcione em todos os dias e horários de funcionamento padrão de todos os CRAS do Rio de Janeiro. A distância e o custo de passagem são dificuldades que impedem muitos moradores de acessar o serviço e garantir os seus direitos. Os relatos que apresentamos aqui surgiram em conversas ocorridas no grupo de WhatsApp.

Vozes de moradores

A moradora Maria José de Freitas Araújo, de 51 anos, nos fala sobre isso:

“É muito boa essa sua ideia do CRAS funcionar aqui pra Manguinhos. Porque aqui no território de Manguinhos tem muitas pessoas idosas. Pessoas com dificuldade de se locomover. As pessoas idosas às vezes precisam e não tem como. Entende? Como tem uma amiga minha que eu estou há meses falando com ela: Ana, vai lá no CRAS do Alemão, vai lá renovar esse CadÚnico. Mas ela tem dificuldade de sair de casa porque infartou tem pouco tempo. Aí acaba não indo, ficando dentro de casa, se acomodando, e nada é feito. Tem pessoas que precisam e não tem como se locomover para ir ao local. Muita das vezes também não tem dinheiro de passagem.”

O movimento para conseguir assinaturas para o abaixo-assinado tem crescido e tem conseguido cada vez mais participação. Quando discutíamos a melhor forma de obter mais assinaturas a Maria José fez a seguinte proposta:

“Se você puder alcançar a minha Agente de Saúde, que é da Equipe Amizade, a Zoraia… Se você puder alcançar esse papel pra ela, aí ela me passa. Aí eu vou passando por aqui, nas redondezas daqui.”

A Maria Mercês Barbosa dos Santos, de 64 anos, que também é moradora de Manguinhos, fala também sobre as dificuldades de ir ao CRAS que fica distante. Ela acredita que essa luta será vitoriosa:

“É, mas a gente vai conseguir, se Deus quiser! Teve um tempo que ele era aqui [CRAS], depois ele mudou lá para aquele lado de lá da rua. Lá onde hoje faz balé, aqui mesmo na rua. Depois, faz muito tempo isso, depois ele foi lá para o Jacaré, lá para baixo, pro Jacaré. Eu me lembro que cheguei da Paraíba uma vez e tive que ir para lá. Aí depois ficou esta confusão, tem aqui na Varginha, mas não resolve, tem aqui no Manguinho, mas não resolve. (…) Nem sempre a gente tem! Tem dias que a gente não tem dinheiro nem para comprar um pão, para dar para o neto, para dar para o filho, imagina! Eu mesma quantas vezes pedi emprestado, cartão emprestado, dinheiro emprestado, entendeu? Ainda tem mais uma, teve uma vez que eu fui e ninguém conseguiu ser atendido. Já descemos do ônibus e já sabendo das notícias. Já tendo que atravessar ou descer para pegar o ônibus de volta. É! Aí fica brabo né! E ele estando aqui, é melhor para a gente. “

Essas são apenas algumas das muitas vozes de Manguinhos sobre a necessidade de que os moradores de Manguinhos sejam atendidos em um CRAS localizado nesse território. Esse problema da falta do CRAS em Manguinhos atrapalha o trabalho das escolas e das unidades de saúde? Por quê? Como esses equipamentos públicos podem participar dessa luta dos moradores de Manguinhos? Venha conversar sobre isso em nosso grupo de WhatsApp.

Greve Geral pelo Clima

O MANGUINHO 73 – 16 DE FEVREIRO DE 2023

Enchentes e CRAS em Manguinhos

Vozes de Manguinhos

Alenita de Jesus, Michele Rocha e Paula Bonato na atividade Vozes de Manguinhos. Foto: Maria das Mercês

Manguinhos no último dia 7 de fevereiro viveu mais uma tragédia provocada por chuvas fortes. Essa não é a primeira vez que os moradores de Manguinhos têm as suas casas alagadas e seus pertences destruídos por conta da água. As enchentes em Manguinhos têm uma história longa. São décadas de abandono e obras mal feitas por parte do poder público. Há um sentimento geral entre os moradores de que estão largados à própria sorte. Em nosso grupo de WhatsApp muitos depoimentos e vídeos foram enviados testemunhando os acontecimentos da penúltima terça-feira. No último domingo, dia 12 de fevereiro, um pequeno grupo de moradores e servidores públicos da Fiocruz, em uma atividade chamada Vozes de Manguinhos, conversou com moradores na Feira de Manguinhos sobre o problema das enchentes. Nessa edição, apresentamos uma seleção desses depoimentos.

As obras do PAC

É comum, por exemplo, nos relatos de moradores a indicação de que as obras do PAC em Manguinhos não resolveram o problema mas, pelo contrário, pioraram a situação em muitas áreas deste território. Para Michele Rocha é preciso mais atenção aos territórios vulnerabilizados:

“Em relação às enchentes a obra do PAC piorou muito algumas área da comunidade que não enchiam e hoje enchem. A rua que eu moro não enchia e hoje enche. Na escada do primeiro andar, todas enchem. Eu tenho uma casa no primeiro andar da minha família que nem alugamos porque enche. A dragagem do rio tem que ser feita. Tem aproximadamente 10 ou 15 anos que essa dragagem foi feita. E não foi feita completa, porque como tudo que é pra gente da comunidade, que somos a parte mais fragilizada, tudo é feito pela metade. A dragagem foi feita pela metade, a obra do PAC também foi feita pela metade, não teve fim. Então a gente precisa realmente de um olhar especial pra gente da comunidade. Não só pra nossa comunidade, mas pra todas.”

Coleta eficiente e dragagem dos rios

Alenita de Jesus chama atenção para o problema da falta de caçambas de lixo, para o precário serviço público de coleta e para a necessidade de dragagem dos rios:

“É preciso acabar com a enchente em Manguinhos. O pessoal está muito sofrido e perdem tudo. Mais caçambas de lixo, porque o caminhão passa assim de manhã, mas o pessoal que vai pro trabalho de manhã e chega não tem o caminhão passando, vai lá na caçamba, tá transbordando, bota no chão. Não tem onde botar, não vai poder voltar com o lixo pra casa. O saneamento de esgoto aqui é muito precário. É tudo entupido, então no dia da enchente quando o rio transborda. O rio se encontra, tanto do Jacaré quanto do Manguinho. UrgêncIa de dragar, por favor, mais atenção pro nosso bairro de Manguinhos, que perde tudo quando tem enchente.”

CRAS Manguinhos

Entre os muitos problemas apresentados, alguns moradores também relataram as dificuldades que encontram para buscar ajuda e apoio nos serviços públicos de Assistência Social. Sabrina reclama que os moradores de Manguinhos precisam ir até o Complexo do Alemão para serem atendidos. O CRAS (Centro de Referência em Assistência Social) destinado ao atendimento de Manguinhos está localizado em Ramos:

“Meu nome é Sabrina, tenho 29 anos. Sou mãe de duas crianças, uma de oito e outra de seis. Sou moradora de Manguinhos e acho que foi na quarta-feira eu soube que ia ter um cartão, que ia ajudar os moradores, mas era aqui no CRAS do Manguinhos. Eu como moradora aqui de Manguinhos fui lá e não podia receber, tinha que ir lá pro Complexo do Alemão. E com a casa cheia, eu não tinha mais dinheiro de passagem. O dinheiro de passagem que eu tinha, o dinheiro da semana, eu gastei com produtos de limpeza. E não tem lógica isso, a gente morador de Manguinhos tem que ir pro Complexo do Alemão? Tem um CRAS aqui perto, aqui do lado, mas só atende o pessoal do Jacarezinho e outros lugares. É esse o meu relato.”

O CRAS de Ramos atende no CCDC da Varginha nas segundas e quintas por ordem de chegada, a partir das 8:30h. A quantidade de atendimento tem sido insuficiente, segundo moradores que necessitam do serviço.

A revolta pelo CRAS localizado em Manguinhos não atender os moradores desse território fez com que surgisse a proposta de ser feito um abaixo assinado reivindicando a solução desse problema. O que vocês acham dessa proposta? Como fazer isso?

Unidos de Manguinhos

O MANGUINHO 72 – 09 DE FEVREIRO DE 2023

A luta continua!

José de Beserra de Manguinhos

Seu Beserra em atividade militante em Manguinhos. Foto: Maria das Mercês.

Quais são as necessidades locais de Manguinhos? Conversar com os moradores mais antigos, conhecer suas histórias e ouvir o que eles tem para falar nos ajudam a compreender melhor a realidade? Nessa semana O Manguinho conversa com o líder comunitário de Manguinhos, José Beserra de Araújo.

Do Nordeste a Manguinhos

Seu Beserra, como é conhecido, é pernambucano, morador de Manguinhos e militante do Movimento das Comunidades Populares, o MCP. Mora na cidade do Rio de Janeiro há 57 anos, mas é de origem camponesa, filho de uma família que vivia da terra. Ele é como muitos outros milhares de nordestinos que vieram para as regiões metropolitanas de São Paulo e do Rio de Janeiro na década de 1960 em busca de melhores condições de vida. Chegou no Jacarezinho em 1963, com 17 anos. Em suas lembranças dessa época ele recorda também de Manguinhos:

“Quando eu cheguei aqui em 1963 já tinha sido inaugurada a Igreja de São Daniel e tinha sido feito um conjunto de casas. Essas casas da Rua Santana do Livramento, da Gregório de Sá, e outras ruas paralelas do outro lado da Estrada de Manguinhos. Aquelas ruas ali também foram construídas nesse período. Mas quando eu cheguei aqui já havia sido construídas essas casas. (…) O nome do campo era Campo do Carioca e ele vinha até aqui perto da Avenida dos Democráticos por dentro da favela, né? Em 1963 bem no começo, quando eu cheguei aqui, o pessoal começou a invadir o campo e fazer casas. Marcava com barbante lá. O pessoal marcou e conseguiu fazer casas e não houve nenhuma reação. E o pessoal fez as casas que estão aí até hoje. E a vida mudou muito.”

Da Ditadura à democracia

Algum tempo depois do Seu Beserra chegar no Rio, o Brasil passou a ser governado por militares, que chegaram ao poder em 1964 por meio de um golpe. Durante a Ditadura Militar, Seu Beserra que ainda era muito jovem, lembra de algumas investidas do Exército em Manguinhos. Com o final da Ditadura em 1985 ele começou a se envolver de forma mais efetiva com a militância política:

“Nesse período de 1989, foi quando eu conheci o Gelson, que era do MCP (MCL). Nesse mesmo período eu conheci o Gilson e algumas pessoas da Associação de Moradores. O seu João era presidente da Associação. O objetivo do MCL (Movimentos das Comissões em Luta) era ir pra favelas e criar comissões de luta por melhorias, sejam elas quais fossem. Quando a gente começava isso a gente fazia uma pesquisa. Era bem simples, tinha três perguntas. A pesquisa era: qual o problema principal da comunidade? Por que o problema existe? E o que já foi feito pra resolver o problema? A gente ia de casa em casa e ficamos mais de um mês fazendo essa pesquisa. Algumas pessoas respondiam na hora e outras a gente passava depois pra pegar a resposta. Um trabalho de muita dedicação. Conseguimos fazer essa pesquisa e apareceram os três problemas principais. Apareceram muitos problemas, mas a gente baseia nos três principais, que foram: esgoto, iluminação pública e enchente.”

Seu Beserra também lembra de um acontecimento político importante para Manguinhos em 1991:

“Em 1991 foi uma das maiores enchentes que teve em Manguinhos. A enchente foi de noite. O pessoal amanheceu o dia jogando os móveis fora: colchões, guarda-roupa, muitas coisas que estragou. Eles jogavam fora trazendo aqui para a Avenida dos Democráticos. Quando foi umas 9h mais ou menos eu saí com o Gilson. Eu falei: Gilson, é melhor a gente fechar a Democráticos. Ele concordou. E saímos avisando para as pessoas da comunidade . Saímos avisando em umas cinco ou seis ruas “que 10h a Democráticos vai ser fechada”. E nós andamos um pouco e quando chegamos na Democráticos a rua já estava fechada sem a gente. O povo mesmo fechou a rua sozinho. Fizeram uma montanha de entulho de geladeira, de sofá, uma montanha aqui no meio da avenida. Ficou de 10h até 5h da tarde com a Democráticos fechada.”

Para o Seu Beserra, a luta sempre continua:

“O espaço de vocês dois é o mesmo espaço nosso. Em direção de libertação do povo. Libertação das garras do capitalismo. A gente continua na esperança de continuar a luta. E um dia a luta dar certo.”

Como você responderia a seguinte pergunta: Quando a luta dá certo? Entre em nosso grupo de WhatsApp e também nos fale sobre outros moradores de Manguinhos que também estão por aí na luta.

Manguinhos resiste a mais uma enchente