Portal ENSP - Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca Portal FIOCRUZ - Fundação Oswaldo Cruz

O MANGUINHO 72 – 09 DE FEVREIRO DE 2023

A luta continua!

José de Beserra de Manguinhos

Seu Beserra em atividade militante em Manguinhos. Foto: Maria das Mercês.

Quais são as necessidades locais de Manguinhos? Conversar com os moradores mais antigos, conhecer suas histórias e ouvir o que eles tem para falar nos ajudam a compreender melhor a realidade? Nessa semana O Manguinho conversa com o líder comunitário de Manguinhos, José Beserra de Araújo.

Do Nordeste a Manguinhos

Seu Beserra, como é conhecido, é pernambucano, morador de Manguinhos e militante do Movimento das Comunidades Populares, o MCP. Mora na cidade do Rio de Janeiro há 57 anos, mas é de origem camponesa, filho de uma família que vivia da terra. Ele é como muitos outros milhares de nordestinos que vieram para as regiões metropolitanas de São Paulo e do Rio de Janeiro na década de 1960 em busca de melhores condições de vida. Chegou no Jacarezinho em 1963, com 17 anos. Em suas lembranças dessa época ele recorda também de Manguinhos:

“Quando eu cheguei aqui em 1963 já tinha sido inaugurada a Igreja de São Daniel e tinha sido feito um conjunto de casas. Essas casas da Rua Santana do Livramento, da Gregório de Sá, e outras ruas paralelas do outro lado da Estrada de Manguinhos. Aquelas ruas ali também foram construídas nesse período. Mas quando eu cheguei aqui já havia sido construídas essas casas. (…) O nome do campo era Campo do Carioca e ele vinha até aqui perto da Avenida dos Democráticos por dentro da favela, né? Em 1963 bem no começo, quando eu cheguei aqui, o pessoal começou a invadir o campo e fazer casas. Marcava com barbante lá. O pessoal marcou e conseguiu fazer casas e não houve nenhuma reação. E o pessoal fez as casas que estão aí até hoje. E a vida mudou muito.”

Da Ditadura à democracia

Algum tempo depois do Seu Beserra chegar no Rio, o Brasil passou a ser governado por militares, que chegaram ao poder em 1964 por meio de um golpe. Durante a Ditadura Militar, Seu Beserra que ainda era muito jovem, lembra de algumas investidas do Exército em Manguinhos. Com o final da Ditadura em 1985 ele começou a se envolver de forma mais efetiva com a militância política:

“Nesse período de 1989, foi quando eu conheci o Gelson, que era do MCP (MCL). Nesse mesmo período eu conheci o Gilson e algumas pessoas da Associação de Moradores. O seu João era presidente da Associação. O objetivo do MCL (Movimentos das Comissões em Luta) era ir pra favelas e criar comissões de luta por melhorias, sejam elas quais fossem. Quando a gente começava isso a gente fazia uma pesquisa. Era bem simples, tinha três perguntas. A pesquisa era: qual o problema principal da comunidade? Por que o problema existe? E o que já foi feito pra resolver o problema? A gente ia de casa em casa e ficamos mais de um mês fazendo essa pesquisa. Algumas pessoas respondiam na hora e outras a gente passava depois pra pegar a resposta. Um trabalho de muita dedicação. Conseguimos fazer essa pesquisa e apareceram os três problemas principais. Apareceram muitos problemas, mas a gente baseia nos três principais, que foram: esgoto, iluminação pública e enchente.”

Seu Beserra também lembra de um acontecimento político importante para Manguinhos em 1991:

“Em 1991 foi uma das maiores enchentes que teve em Manguinhos. A enchente foi de noite. O pessoal amanheceu o dia jogando os móveis fora: colchões, guarda-roupa, muitas coisas que estragou. Eles jogavam fora trazendo aqui para a Avenida dos Democráticos. Quando foi umas 9h mais ou menos eu saí com o Gilson. Eu falei: Gilson, é melhor a gente fechar a Democráticos. Ele concordou. E saímos avisando para as pessoas da comunidade . Saímos avisando em umas cinco ou seis ruas “que 10h a Democráticos vai ser fechada”. E nós andamos um pouco e quando chegamos na Democráticos a rua já estava fechada sem a gente. O povo mesmo fechou a rua sozinho. Fizeram uma montanha de entulho de geladeira, de sofá, uma montanha aqui no meio da avenida. Ficou de 10h até 5h da tarde com a Democráticos fechada.”

Para o Seu Beserra, a luta sempre continua:

“O espaço de vocês dois é o mesmo espaço nosso. Em direção de libertação do povo. Libertação das garras do capitalismo. A gente continua na esperança de continuar a luta. E um dia a luta dar certo.”

Como você responderia a seguinte pergunta: Quando a luta dá certo? Entre em nosso grupo de WhatsApp e também nos fale sobre outros moradores de Manguinhos que também estão por aí na luta.

Manguinhos resiste a mais uma enchente